excluídos.
Os
detentores do capital aperfeiçoam seus mecanismos de exploração, maximizando os investimentos
tecnológicos e a financeirização da economia. Aos pobres restam “migalhas”.
Qual lógica está por detrás desse sistema? Como nossa prática socioeconômica revela nossas
“crenças”, proponho uma reflexão sobre essa questão sob o prisma teológico-pastoral. Qual
conceito de Deus nossa sociedade cultiva, hoje? Aquele que é gerador de comunhão entre os
humanos ou propulsor da concorrência e do sucesso individual, finalmente, um ídolo? Qual crença
nos propomos ter?
“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24).
O “dinheiro”, mencionado por Cristo, simboliza
o capital que, ao longo da história, tem sido acumulado, tendo, hoje, um grau elevado de
virtualidade. O mercado financeiro é feito por dinheiro que gera dinheiro, sem lastro real. O capital,
nessa forma, dá impressão de ser um “deus que gera a si mesmo”. Esse extremo resulta de uma
economia sob a lógica da mercantilização total, fundada na exploração desenfreada dos recursos
naturais e da mão-de-obra, cujo lucro é canalizado para a geração de mais lucro.
Essa “economia sem coração” não está em função da coletividade humana. Ela se funda na
liberdade e na concorrência de mercado que sacrifica vidas humanas. Essa lógica sacrificial foi
explicitamente questionada por Jesus: “Ide, pois, e aprendei o que significa: ‘eu quero misericórdia
e não sacrifício’” (Mt 9,13). Hoje, a classe trabalhadora tem sido imolada, ou seja, sacrificada no
altar do “trabalho explorado” ou do “não trabalho”, em oferenda ao “deus capital”.
A impossibilidade do trabalho, o trabalho precário e o trabalho com função antissocial resultam de
uma lógica econômica idolátrica, cruelmente mortal. A fé no Deus verdadeiro, de inspiração judaicocristã,
sinaliza uma lógica totalmente oposta. Deus, segundo essa tradição é fonte de vida. Ele é,
portanto, libertador de sistemas que causam a morte, a exemplo da libertação dos hebreus no Egito,
relatada no livro do Êxodo.
A identidade libertadora de Deus se manifestou, também, na conquista da “terra prometida”, na
atuação dos profetas e na missão de Cristo, o Verbo encarnado (cf. Lc 4,16-21). Este assumiu a
“condição de escravo”, isto é, de trabalhador do seu tempo (cf. Fl 2,5-11), adentrando a realidade
de morte gerada sobretudo pelo trabalho opressor, para resgatar os oprimidos e dar-lhes vida.
O
próprio Jesus o diz: “O ladrão vem só para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham vida,
e a tenham em abundância” (Jo 10,10).
Jesus foi um trabalhador manual, identificado com trabalhadores comuns. Seu “trabalho” evoluiu
para a “obra” que o Pai lhe confiou e assumiu-a até o fim (cf. Jo 17,4). Sua doação total para a
salvação da humanidade, tornou-se missão dos que nele creem. A sociedade brasileira se inspira,
hoje, no Deus revelado em Cristo ou na falsa crença de um desenvolvimentismo que concede à
maior parte da população somente as “sobras dessa festa macabra”?
Se nos orientamos por uma fé
falsa, certamente nossa crise é maior do que parece, necessitando mudanças mais radicais.
Jales, 23 de janeiro de 2018.