Dom Reginaldo Andrietta, Bispo Diocesano de Jales
A intervenção federal na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro tornou-se publicamente
polêmica. Os proveitos polÃticos do governo federal, dos militares e dos mancomunados com essa
intervenção são evidentes, tanto quanto o desinteresse deles por solucionar as causas reais da
insegurança pública nesse e nos outros Estados, onze deles com Ãndices mais altos ainda de
violência. Se os intervencionistas fossem bem-intencionados dialogariam com os muitos setores da
sociedade civil desse Estado, que trabalham para a superação da violência, antes de recorrerem à s
forças militares.
O militarismo nunca foi nem será solução para a violência gerada e fomentada por modelos
socioeconômicos, como o qual estamos submetidos. A Igreja Católica no Brasil, por meio do texto
base de sua Campanha da Fraternidade deste ano, cujo tema é “Fraternidade e Superação da
Violênciaâ€, faz esse alerta, dizendo que “o incremento da violência é determinado por múltiplos
fatores, dificilmente reduzido a uma causalidade única. Entretanto, não se pode ignorar a influência
do contexto socioeconômico na geração da violênciaâ€.
“Tem sido uma tendência, em diferentes partes do mundo, a instituição de um modelo de combate
à violência em que o cidadão abre mão de parte de seus direitos e concede ao Estado maior poder
de intervenção e de repressãoâ€.
O texto base da Campanha da Fraternidade é, nisso, incisivo ao
enfatizar que “muitas vezes a sociedade tem desistido de seus direitos para vislumbrar alguma
segurançaâ€. Muitos, assim, no Brasil, hoje, estão desejando um regime militar, em lugar de se
engajarem na luta por uma nação economicamente justa e socialmente solidária.
Enganam-se os defensores de um governo militar, por muitas razões, entre as quais por
desconhecerem que o militarismo no Brasil sempre defendeu o interesse das elites, em nome de
uma falsa segurança nacional. Grande parte de nossos recursos, por exemplo, foram e continuam
sendo apoderados por grandes corporações transnacionais, com graves consequências sociais e
ambientais, sem que isso seja entendido por muitos polÃticos e militares como afronta à nossa
soberania e agressão ao nosso povo.
Os grandes inimigos do povo estão, então, realmente, nos
morros do Rio de Janeiro?
Afinal, os cariocas necessitam de defesa militar ou de investimento, até mesmo dos milhões de reais
da intervenção militar, em profissionalização e geração empregos de qualidade, em melhoria das
condições de educação, habitação, saúde e outros serviços? É triste saber que muitos jovens dos
bairros pobres do Rio de Janeiro e de todo o Brasil, encontram mais oportunidades de ocupação e
renda no tráfico de entorpecentes do que em atividades educacionais e profissionais.
O Estado que
queremos é esse que despreza e até trata os socialmente excluÃdos como inimigos sociais?
“Os governadores das nações as dominam e os grandes têm poder sobre elas. Entre vocês não
deverá ser assim†(Mt 20,25-26). Essas palavras de Jesus mostram a incompatibilidade do amor ao
próximo por ele vivido e ensinado, com o poder, sobretudo militarista. Os meios violentos para
resolver questões sociais, disfarçados de segurança, só geram mais violência.
Aprendamos, então
de Jesus, o valor do seu ensinamento: “vós sois todos irmãos! (Mt 23,8), lema, aliás, da Campanha
da Fraternidade deste ano. Recusemos, portanto, todos os meios violentos de gestão pública e
resolução de problemas sociais, por mais justos que possam parecer.
Jales, 22 de fevereiro de 2018.